Vicentinho ocupou cargo de segundo escalão no governo Bolsonaro e revela por que deixou o governo. “Não concordava com o que estava acontecendo. Não era o meu estilo de fazer política. Não saí de última hora, não. Saí lá no começo. Vi que não dava. Não era bem aquilo que imaginava que poderia produzir e me relacionar. A forma, o comportamento das pessoas com quem eu convivi e que eu via não era o meu estilo”, conta o ex-senador, que foi secretário de Infraestrutura Turística no Ministério do Turismo.
O ex-senador demonstra certa mágoa pela postura de bolsonaristas do Tocantins e de Brasília que, segundo ele, arrancaram o PL de suas mãos, deixando ele e seu filho, o deputado federal Vicentinho Júnior, sem legenda para disputar as eleições. Vicentinho reclama que pela primeira vez na história do Tocantins, não disputou eleição. “Fiquei pela primeira vez sem a menor condição disputar uma eleição no Estado. Você sabe que toda a vida fui igual folião, todo ano estou no giro, toda eleição estou disputando”, ressalta.
Vicentinho observa que algumas coisas são inerentes ao indivíduo: a vida, o pensamento, a fé e o voto. “O voto é próprio, ele é único, é meu. Daí eu quero dizer que a gente precisa executar tudo isso que é próprio, de forma harmônica, respeitosa, democrática. Uma das razões pelas quais não concordo com o atual governo Bolsonaro é que ele promoveu um racha no País. Racha no que diz respeito às religiões, às famílias, a tudo”, declara o líder tocantinense.
O sr. ocupou cargo no governo Bolsonaro e deixou a função por discordar do comportamento do presidente. O que o motivou a ter uma postura mais incisiva neste segundo turno a favor de Lula e como o sr. avalia sua participação na campanha dele no Tocantins?
Deixe-me contar como foi tudo isso. Eu participei por quase um ano, lá no início, do governo Bolsonaro. Não a convite dele, por uma missão do PL, por indicação da bancada do partido, que achou por bem, depois de vários nomes que tiveram dificuldade de passar pela Abin [Agência Brasileira de Inteligência], me indicar. O nome passou e assim eu fiquei. Com menos de um ano, eu resolvi entregar o cargo. Fui ao partido com o ofício, entregando o cargo e agradecendo a indicação. Fui ao Wellington Roberto [pP-PB, líder da bancada do partido], que me indicou e o agradeci. Então me dirigi ao [senador] Ciro Nogueira (pP-PI), na época, junto estava o meu filho, o deputado [federal, Vicentinho Júnior (pP), o prefeito de Muricilândia, meu compadre Alessandro [Borges] e o deputado Arthur Lira (pP-AL), e entreguei o cargo. Me perguntaram se queria ficar mais, eu disse não. Dei por encerrado.
Não concordava com o que estava acontecendo. Não era o meu estilo de fazer política
Não concordava com tudo que estava acontecendo. Não era o meu estilo de fazer política. Daí, encerrei, cumpri, graças a Deus, esse período dentro da mais perfeita ordem e entreguei o cargo. Não saí de última hora, não. Saí lá no começo. Vi que não dava. Não era bem aquilo que imaginava que eu poderia produzir e me relacionar. A forma, o comportamento das pessoas com quem convivi, que eu via, não era meu estilo.
A turma de Bolsonaro, tanto do Estado quanto em nível federal, nos arrancou o partido de forma brutal
Agora veio a campanha, meu filho foi muito sacrificado. Eu também. A turma do Bolsonaro, você sabe muito bem quem são, tanto do Estado quanto a nível federal, nos arrancou o partido de forma brutal, faltando menos de um mês [para o prazo final de filiação] para ficar no limbo, buscar um partido e ainda montar chapa, fazer a campanha e ganhar uma eleição. O deputado, graças a Deus, se saiu muito bem. Não é fácil isso que nós passamos. A gente não é de falar dos problemas, pois para os problemas a gente tem de correr atrás e resolver. E fizemos assim. Para partido, o Júnior encontrou o pP, com o Ciro Nogueira abrindo as portas e o recebendo bem. A senadora Kátia Abreu, da mesma forma. Mas eu fiquei pela primeira vez sem a menor condição de disputar uma eleição no Estado. Você sabe que toda a vida sou sempre igual folião, todo ano estou no giro, toda eleição estou disputando.
Eu manifestei apoio ao presidente [Lula] desde o primeiro turno. Deu um auê danado
O presidente [do pP] Ciro deu total apoio ao deputado Vicentinho Júnior. Isso tem que ser registrado, tem de ser reconhecido. Com isso, o deputado Vicentinho Júnior, mantendo seu padrão de gratidão, de lealdade, apoiou Bolsonaro e apoia, em função do que foi correspondido pelo presidente do pP. O deputado se prontificou que levaria dois. E levou o Lázaro Botelho, eleito deputado federal junto com ele, então tem sido uma convivência maravilhosa entre os dois. Eu já tinha a senadora Kátia Abreu como minha candidata, tive de recuar e ficar por ali no apoio ao deputado, ao governador Wanderlei e ao presidente Lula. Eu manifestei apoio ao presidente [Lula] desde o primeiro turno. Deu um auê danado. Então eu faço questão de agradecer os votos que deram ao Juninho, nosso deputado Vicentinho Júnior.
Não tem nada que dividir família, não concordo em promover o ódio
Costumo sempre dizer que algumas coisas são próprias do indivíduo: a vida, o dom da vida, que Deus lhe deu, ela é sua. É você que tem de cuidar desse patrimônio, que é o maior que você tem. A vida é uma coisa própria do indivíduo. O pensamento, também. Quem é que vai dominar meu pensamento? Fé. A minha fé é eu que me comporto dentro dela, com Deus. Sou católico apostólico romano, compreendo o evangélico, compreendo todas as denominações, até o ateu eu compreendo, o que é democrático, porque é uma coisa individual, dele. E também o voto é próprio, é único, é meu. Daí eu que a gente precisa executar tudo isso que é próprio de forma harmônica, respeitosa, democrática. É essa uma das razões por que não concordo com o atual governo Bolsonaro, que promoveu um racha no País. Racha no que diz respeito às religiões, às famílias, a tudo. Não tem nada que dividir família, não concordo em promover o ódio. Eu quero meu País é unido, quero meu País com respeito às instituições. Com respeito às pessoas, eu quero um País que atenda efetivamente, como o Lula atendeu. Ninguém foi melhor para o agronegócio que o Lula.
Exatamente neste dia 35 milhões de brasileiros não comeram
O que imagino que vai ocorrer em um governo do presidente Lula? Ele vai manter a atenção ao agronegócio, que isso é imprescindível para colocar o alimento na mesa das pessoas do País e do mundo. Vai incrementar a produção, mas com responsabilidade ambiental. O produtor responsável, esse não precisa se preocupar. Agora, o criminoso, que quer que vá a frouxo a questão ambiental, que toca fogo em tudo, que acaba com tudo, que desmata, que não tem o menor critério, o menor respeito, o menor zelo pelas futuras gerações. Esse, se aproveita dos produtores responsáveis. Então, esses eu acho que tem de ficar mesmo com esse radicalismo aí, porque sabem que o mundo exige – e é bom, inclusive, que eles saibam –, que o mundo não vai comprar mais alimento de quem produz com irresponsabilidade ambiental. É só isso, apenas. Lula vai vencer no dia 30, com fé em Deus, vai assumir o governo e tudo vai transcorrer dentro da normalidade com relação ao agronegócio, com responsabilidade ambiental. Não se pode desmatar a Amazônia. Eu que voei muito na Amazônia, agora só voo em cima de desmatamento. As áreas que estão preservadas são as indígenas, apenas. Não é assim que tem de ser. Não se pode fazer isso. Aqui no Tocantins desmatam em nascentes, essa irresponsabilidade não é possível permitir. Eu quero que tenha produção com responsabilidade ambiental. Feliz somos nós, que almoçamos, que tomamos café bem, porque exatamente neste momento 35 milhões de brasileiros ainda não comeram. Não dá para eu dizer que isso está certo. Se eu tenho essa vida digna, quero que meu semelhante, por mais humilde, mais pobre que seja, também tenha uma vida digna.
A fome era um problema grave no Brasil, mas que, durante muitos anos, chegou a ser considerado equacionado, com o País ficando fora do mapa da fome elaborado pela ONU. E é algo que não faz muito tempo…
Sim, quando era o Lula [o Brasil saiu do mapa da fome]. Eu estive em Araguaína e me veio à mente que tudo o que aconteceu por lá foi durante o governo Lula. O aeroporto, a travessia urbana, casas populares, UBS [unidade básica de saúde], asfalto, Via Lago, Parque Simba. Eu era coordenador da bancada no Congresso. Isso com a bancada toda, com o deputado Vicentinho Júnior, demais deputados e senadores, nós viabilizamos, mas o governo central era de Lula. Hoje, você não vê uma parede de casa popular sendo construída neste País. Não existe programa para os pobres, para quem precisa. Conforme as estatísticas, o déficit habitacional de moradia popular deve estar em torno de 15 milhões de unidades. Outro item: banheiro. Parece coisa simples, um banheirinho no fundo da casa de uma pessoa humilde lá da periferia. Você não sabe a importância social de um benefício como este. Nunca mais fizeram isso. Aliás, não está nem no radar deles. Eu não posso concordar com essas coisas. Nós vimos obras estruturantes aqui – porto seco, rodovias, ferrovias, universidades, escolas técnicas etc. É muita coisa que foi feita. Hoje, o País está desse jeito aí, com gente pregando o ódio, presidente em motociatas… Bom para quem gosta, mas será que isso é importante para o País? Sou hoje um cidadão apenas, um aviador da esperança, um voluntário da causa maior do País, que é a eleição do presidente Lula. Então vou dar um voto cristalino como o sol.
Eu estou percebendo que ele [Lula] vai ampliar os votos que teve no primeiro turno
Que avaliação o sr. faz desse trabalho de campanha para o presidente Lula que o levou a percorrer o Estado?
É meu estilo. Como eu disse que queria fazer, aos membros do PT, com quem me relaciono bem. Aliás, me relaciono bem com a classe política de um modo geral. Nunca fui um político de cortar pontes, amizades, não. Sempre procuro compreender o mundo do outro, porque fica mais fácil eu conviver com ele. Então, eu disse que me deixassem livre, solto, como agora estou fazendo, andando pelo Estado, que eu somo mais. Sou um pouco indisciplinado com relação à questão partidária. Sou muito de ir pelo meu pensamento, por minha vontade, acho que assim eu somo mais. Estive em Araguaína, em Colinas, Guaraí, Paraíso, sempre participando de programas de rádio, de televisão, que é a forma mais abrangente, pois o tempo é curto. E também visitando alguns amigos, buscando apoio para o presidente Lula. Tive muita receptividade, essa minha fala para o agro clareia muito para quem ainda não está com aquele voto radicalizado [em Bolsonaro]. O radical a gente deixa e respeita, é democrático. Eu estou percebendo que ele [Lula] vai ampliar os votos que teve no primeiro turno aqui no Tocantins e acho que também no Brasil, para ir além dos 6 milhões de diferença do primeiro turno.
Se eleito, Lula terá de administrar um País dividido, com um Congresso hostil, em meio a uma crise internacional. Qual sua expectativa em relação a um eventual governo Lula?
Tenho essa preocupação, sim, mas costumo dizer que toda mudança gera novas oportunidades. Então, o presidente vai ter a oportunidade de implantar um modelo de gestão dele a partir do zero. Ele vai montar uma boa equipe, com o sentimento popular que tem. Montará e, com certeza, terá o ombro forte para a carga. E, assim, vai fazer o melhor governo da vida dele.
Qual sua expectativa com o novo governo de Wanderlei Barbosa, que saiu das urnas fortalecido?
É a melhor possível. Eu gosto dele. Quando ganhei para prefeito em 1988, o Wanderlei estava em nossa chapa para vereador. O “Lelei”, como era o nome político dele, foi eleito com expressiva votação naquela época. Me ajudou muito em nossa gestão. Estava ali se iniciando, mas todos nós, aprendendo. O governador tem um foco muito forte na dedicação com o povo, isso é importante. Para você governar precisa sentir, precisa ter ligação afetiva com sua gente. Esse é o primeiro ponto. Wanderlei é um homem de compromisso, o que ele trata, cumpre, sem nenhum problema. De modo que eu acredito muito que ele vai fazer uma excelente gestão. É essa a minha impressão, é esse o meu desejo.
Minha formação inicial, você sabe, foi com nosso líder Brizola
O sr. faz alguma ligação desta eleição para presidente com aquela de 1989, em que o então candidato a presidente Leonel Brizola (PDT) lhe entregou a missão de liderar os prefeitos do Brasil em seu apoio?
Sim. Minha formação inicial, você sabe, foi com nosso líder Brizola. Eu trabalhei com ele no Rio [de Janeiro], com a dona Neuza [Brizola], com Cibilis Viana [fundador do PDT junto com Brizola] e iniciei a vida pública exatamente no PDT. De modo que hoje tenho aquele sentimento lá da formação política. Claro, já militei em partidos de direita, mas sempre ficam aqueles princípios que nortearam a formação. Quando chega a hora de decidir, então, você decide mais pelo sentimento socialista, aquela coisa da dedicação ao povo, de ver o povo valorizado, as pessoas sendo tratadas com amor e com felicidade. Isso é o que eu penso.
Tenho falado com os prefeitos, com quem tenho um relacionamento muito bom desde que fui presidente da ATM [Associação Tocantinense de Municípios]. Tenho pedido a eles para fazer tudo que puderem para levar os eleitores para votar. Os eleitores merecem o respeito e a dignidade porque eles votaram no prefeito, na prefeitura, no vereador, na vereadora, em primeiro plano. Então eles merecem o carinho. Eu sei que os prefeitos darão esse carinho, essa atenção de buscar para eles irem às urnas, escolher quem eles quiserem, democraticamente. Esse é o primeiro ponto que peço aos líderes, para dar atenção, principalmente àqueles que têm menos condições financeiras para ir votar. É um momento importante do País, então eu peço muito a todos os líderes que disponibilizem condições para que todos votem.
Aos patrões peço que não oprimam seus trabalhadores, porque eles contribuem para a riqueza das empresas
Aos patrões, peço que não oprimam seus trabalhadores, porque eles contribuem para a riqueza das empresas, das instituições, até porque a opressão está provada que não funciona. O nazismo de Hitler oprimia as pessoas, prendia, mandava para câmara de gás, mas não prendia o pensamento, a convicção. E aí foi o fracasso do regime. Não adianta a opressão se você não tem como dominar o pensamento das pessoas. Deixem as pessoas livres. A vontade da maioria tem de ser respeitada, dentro de nossa democracia. É isso o que penso e desejo para o nosso País.